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Olá a tod@s!

 

Espero que se encontrem bem e que a vida e as cores da Primavera vos tenham trazido uma energia renovada.

Neste artigo de maio, analisamos algumas opções de tradução que resultaram em erros de redundância, regência preposicional e no uso de uma linguagem demasiado informal para o contexto em causa.

O objetivo destes artigos e análises é possibilitar uma compreensão real dos motivos que levam determinadas opções de tradução a tornarem-se «erros», para que seja mais fácil evitar a sua repetição no futuro.

Conforme referido nas publicações anteriores, alguns erros de tradução devem-se ao uso incorreto das regras gramaticais da língua portuguesa, outros, porém, podem dever-se a opções de tradução que, não sendo gramaticalmente incorretas, se tornam desadequadas num dado contexto.  Para aprofundar esta dimensão da tradução e da comunicação, recomendo uma leitura d’A importância do contexto na tradução. *

 

A seguir, analisamos em maior profundidade alguns exemplos reais de traduções realizadas na Gengo, no mês de abril:

 

A] Um caso de redundância

Cada língua, tal como falada no seu espaço geográfico e cultural, tem uma evolução natural, adotando e utilizando mecanismos específicos que, muitas vezes, não são reproduzíveis noutras culturas. O exemplo abaixo ilustra bem este fenómeno.

 

Exemplo:

EN – You can impact all six dimensions of well-being

PT – Pode influenciar todas as seis dimensões do bem-estar ✖

PT – Pode influenciar as seis dimensões do bem-estar ✔

ou

PT – Pode influenciar todas as dimensões do bem-estar ✔

 

Aqui, a estrutura pleonástica «all + number + plural noun» é comumente utilizada na língua inglesa enquanto mecanismo de ênfase. No entanto, embora esta estrutura seja aceite e se encontre amplamente difundida em inglês, a sua tradução literal para português gera uma redundância.

Em português, o uso do artigo definido antes de um sintagma nominal no plural já contém, em si, a indicação de que o sintagma em causa designa a totalidade das entidades a que se refere.

Por exemplo, quando dizemos «Li os livros do Eça», subentende-se: «Li todos os livros do Eça». Por sua vez, quando dizemos «Li livros do Eça», sem o artigo definido, subentende-se: «Li alguns livros do Eça».

 

C] Novamente a regência preposicional – Associar com Vs. Associar a

A questão da regência preposicional já foi amplamente discutida, por exemplo, no Ponto 3 da Retrospetiva de outubro e novembro e no Ponto 2 do documento EN>PT (EU) Erros Comuns. Infelizmente, não existe uma fórmula fixa que nos permita saber sempre qual a preposição selecionada por determinado nome ou verbo. Essas «regras» foram sendo determinadas pela evolução e uso da língua e, sempre que surgem dúvidas, a única forma de as esclarecer é consultando instrumentos de normalização linguística, como gramáticas, dicionários (por exemplo o Dicionário gramatical de verbos portugueses ou o Dicionário sintático de verbos portugueses), publicações científicas ou esclarecimentos por parte de linguistas.

 

Exemplo:

EN – Which word do you associate with your team or department the most?

PT – Que palavra associa mais com a sua equipa ou departamento? ✖

PT – Que palavra associa mais à sua equipa ou departamento? ✔

 

A plataforma Ciberdúvidas, por exemplo, esclarece a regência do verbo «Associar» aqui.

 

C] Casos de informalidade

O grau de formalidade deve adequar-se à tipologia, função e intenção comunicativa do texto, bem como às idades e ao grau de familiaridade entre o locutor e o interlocutor. Assim, a presença de marcas de linguagem informal ou familiar em textos de carácter informativo e publicitário — em que a relação entre o locutor e o interlocutor é de maior distância e tanto o emissor como o público-alvo são adultos —, torna-se desadequada.  

 

Exemplo C1

EN – … packed with clinically proven ingredients.

PT – … cheio de ingredientes clinicamente comprovados ✖

PT – … repleto de ingredientes clinicamente comprovados ✔

 

Exemplo C2

EN – There are a ton of options for scan customization,

PT – Existem montes de opções para a personalização da varredura ✖

PT – Existem inúmeras opções para personalizar a deteção de vírus ✔

 

Exemplo C3

EN – Introducing a bunch of features that will help you start your own edible garden. 

PT – Apresentamos uma data de funcionalidades que vão ajudá-lo a começar o seu próprio jardim comestível   ✖

PT – Apresentamos uma grande variedade de ferramentas/funcionalidades que irão ajudá-lo a começar a cultivar a sua própria horta ✔

 

Para terminar, relembro que as vossas dúvidas linguísticas e de tradução são sempre bem-vindas e que a equipa de especialistas linguísticos da Gengo estará sempre disponível para as esclarecer.

 

Continuação de boas traduções e até breve.

 

Sara Nogueira

Especialista linguística de português europeu na Gengo

 

* Ponto 2 do Capítulo I da Tese de Mestrado em Línguas Aplicadas e Tradução de Irene Amaral Ferreira da Silva Universidade de Évora, Escola de Ciências Sociais

 

2 comments

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    José Guedes

    Oi Sara, (odeio a vírgula separando o vocativo no caso de saudações iniciando mensagens haha)

    Texto interessantíssimo! É a primeira vez que dou uma olhada na seção "Community" e adorei a sua série de retrospectivas.

    Contudo, confesso descordar de você em alguns pontos. Por exemplo, o item A é, para mim, um claro exemplo de pleonasmo, que, quando usado corretamente, é um recurso estilístico perfeitamente válido e cabível tanto em textos formais quanto informais, pelo menos ao meu ver. Também confesso que não consideraria o último exemplo citado uma tradução válida. Eu mesmo não fazia ideia de quantas dimensões do bem-estar existiam e imagino que a maioria dos leitores também não. Remover o número, na minha opinião, seria um erro muitas vezes mais grave do que mesmo uma redundância não pleonástica pois uma informação potencialmente crucial foi omitida.

    Descordo também de todos os exemplos C. No caso de C1, também prefiro "repleto de". Contudo, "cheio de" me parece uma alternativa perfeitamente válida. Talvez esta expressão seja considera mais informal em Portugal do que aqui no Brasil. Já em relação a C2, "a ton of" é uma expressão indiscutivelmente informal e, sendo assim, "montes de" ou  "existe um monte de", em português brasileiro, seriam perfeitamente cabíveis. O mesmo se aplica a C3, que também inclui uma expressão claramente informal.

  • 0
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    Sara (EN>PT Language Specialist)

    Olá José, [esta vírgula é uma regra do bom-uso da língua e até faz mais sentido do que um ponto final ou ausência de pontuação, porque não gosta de a ver ou usar? :) ]

    Muito obrigada pelo feedback positivo em relação às retrospetivas :)

    Em relação aos itens que refere, o que posso dizer é que em comunicação e em tradução TUDO é dependente do contexto e do propósito de comunicação. Aquilo que é aceitável num contexto pode não ser no outro.

     

    Em relação ao item A (pleonasmo enquanto recurso de estilo), concordo que vários tipos de pleonasmo são aceitáveis em diferentes tipos de texto. Não concordo que seja o caso específico aqui "todos os três" "todos os dois" "todos os cinco" etc., quer pelo pleonasmo em si, que não é usual nem correto em português europeu, que porque o texto fornece a informação necessária para sabermos que há seis dimensões de bem-estar. Ou seja, ao escrevermos:  "Pode influenciar as seis dimensões do bem-estar" ou "Pode influenciar todas as dimensões do bem-estar" o leitor já sabe que engloba "todas" ou "seis".

    Relativamente ao item C1 e C2, é também uma questão cultural. Os graus de formalidade aceitáveis variam muito de cultura para cultura. Por vezes, ao traduzirmos uma expressão informal de forma "fiel" ao texto original não estamos a ser "fiéis" ao que é expectável e mais aceitável na língua/cultura de chegada. A menos que o público seja muito jovem e o contexto descontraído/intimista a linguagem mais informal em Portugal não é habitual para públicos de várias idades (que incluem público adulto e possivelmente sénior). Acredito que no Brasil seja perfeitamente aceitável, não posso opinar porque não estou por dentro da cultura e, logo, não saberia avaliar o grau de adequação destas expressões num contexto diferente do meu.

    Há cada vez mais linguagem informal em Publicidade e Marketing em Portugal, muito porque o público infantil e jovem passou a representar numa grande fatia dos "consumidores". Já a linguagem da publicidade dirigida ao público adulto é muito mais formal e, quando não o é, assume-se como "humorística" (ou seja, sem esse toque de "humor" assumido, talvez não fosse tão aceitável).

    Espero ter conseguido explicar e justificar de forma mais detalhada o motivo pelo qual as traduções em PT europeu devem evitar expressões como "uma data de", "montes de" ou, por exemplo, "medicamentos cheios de ingredientes".

    Um bem-haja :)

     

     

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